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segunda-feira, 30 de maio de 2016

História, periferia e música (hip-hop) em uma capital nordestina

 



 

Esta matéria foi originalmente publicada em Campus/O Dia


Luiz Sávio de Almeida é Coordenador de Campus e Viviane Rodrigues, relações públicas, assessora do Museu Cultura Periférica, membro do Centro de Estudos e Pesquisa Afro Alagoano Quilombo


               Em torno de 2012 começamos a levantar depoimentos que identificavam um conjunto de circunstâncias sobre a história de nossa periferia. Neste caminho, sempre mantivemos estreita relação com Museu Cultura Periférica, ligado ao Centro de Estudos e Pesquisa Afro Alagoano Quilombo. Nosso objetivo, era apenas o de recolher informações e publicarmos para ajudar a algum pesquisador que se dedicasse a estudar as manifestações culturais de nossa periferia.

            Decidimos divulgar  alguns textos de nossa colaboração, nada detalhando e nem mesmo afirmando: apenas preocupações que podem ou não fazer sentido mas que podem e talvez devam entrar na ordem da discussão.

            Próximos Campus aparecerão os textos dos depoimentos, especialmente falas de DJs. Aliás, deve ser dito que em Espaço em O Jornal, publicamos vários textos sobre a periferia e, dentre eles, dois sobre hip-hop. Este texto é bem antigo, mas responde, ainda, pela vida dos artistas deste campo em Maceió. Ele está como foi escrito (uns dois anos), salvo ligeiras intercalações.

Um abraço, boa leitura

Sávio



Luiz Sávio de Almeida e Viviane Rodrigues

Periferia e escrita da história

           
Ari Oliveira, uma entrevista chave
Sempre tivemos a intenção de publicar depoimentos de pessoas que viveram – e vivem – o que hoje é chamado de periferia de Maceió, termo que dever ser também associado à intensa movimentação cultural e política que vive toda uma área dita de baixa renda e alta cultura. Um de nossos objetivos consistia em abrir espaço para a escrita de uma história desta periferia, normalmente submersa na ideia generalizante de cidade, que intenta transformar em condição homogênea um lastro cultural necessariamente heterogêneo e, assim, podendo, com maior facilidade, tentar o impossível: liquidar o diferente ou desautorizar a sua importância, como, no caso, via de regra, se pretende com a  periferia.
            Ela abriga a baixa renda, pessoas pobres imprensadas em grotas e outros conjuntos similares. A história dessa periferia nunca foi traçada em profundidade, como se os grupos marginalizados socialmente não tivessem a dignidade de sujeitos da polis, encravados dentro de um processo que pretende anulá-los inclusive pela historiografia e pela visão do urbano que se desenvolve.

Uma parceria

          
Primeiro Grupo de rap em Alagoas
 
Faz tempo que publicamos o nosso primeiro trabalho, foi em um suplemento intitulado Espaço, que saía aos domingos, em O Jornal. Este primeiro trabalho ligou-se, dentro do movimento periférico ao hip hop, tomando o Mc Will como canal para este universo artístico, mas também político, ele, que era estudante de matemática da UFAL, também traduzia esta periferia.  A este trabalho seguiram-se diversos textos com depoimentos de moradores e artistas, que foram publicados no mesmo suplemento e, também, em Contexto suplemento que existiu no jornal Tribuna Independente.
            Ao tempo em que realizávamos e publicávamos esses registros, crescia o trabalho do Museu Cultura Periférica ligado ao Centro de Estudos e Pesquisa Afro Alagoano Quilombo, assessorado diretamente pela co-autora desse artigo e do qual Espaço e Contexto passaram a utilizar informações e a servirem como divulgadores; bem mais do que entrevistas no sentido formal, na verdade o que surgia como informação e análise era fruto de um diálogo entre o Quilombo e o seu próprio lugar através das atividades do Museu.

Museu Cultura Periférica

            O Museu fez crescer registros sobre essa periferia, gerando documentação sobre a vida de Maceió, fotografando, gravando, filmando aspectos da vida cotidiana e recolhendo relatos de pessoas que viveram a construção da cidade, acelerada pela inchação urbana cujo início, com clareza, foi nos anos 60; embora existisse uma pobreza, o impacto foi grande sobre a organização da cidade a partir dos acontecimentos que marcaram a década mencionada.
           
O Museu continua operando junto ao mesmo Quilombo, organização integrada à Articulação pela Cultura Popular e Afro Alagoana. A ideia de um museu que estava criado e associado à  dinâmica do cotidiano, nos incentivou a continuar buscando e divulgando informações sobre o movimento periférico que existe em articulação com a vida a que chamaremos  afroalagoana, termo meio píntoso mas que ajuda a expressar o que desejamos. A experiência de ter pensado sobre o hip hop levou-nos a querer registrar as suas raízes em Maceió e, nisto, buscarmos o depoimento de pessoas que estiveram nos momentos iniciais, fazendo com que a ligação entre o artístico e o social se demonstrasse.
            Daí, no ano de 2012, a partir de entrevistas feitas por Viviane Rodrigues,  saímos listando, contatando e entrevistando pessoas que, de alguma forma, viram e viveram a chegada de novos componentes culturais ao dia a dia da periferia.  Realizamos em torno de dez entrevistas. Hoje estamos começando a divulgar este rico material.

Depoimento e história

O pessoal do Santo Eduardo
            Todos nós temos a dizer sobre a vida; de certa forma, se todos não somos historiadores, somos arquivos de circunstâncias e emoções. É absolutamente impossível conceber um depoimento que seja neutro, como se fosse viável colocar uma parede de chumbo entre o sujeito e a vida que teve e tem. Todos os depoimentos são pautados por essa ligação, cada perspectiva pode ser aumentada, diminuída, retirada por pessoas que vivem o mesmo momento  e estabelecem os próprios limites e recortes.
            Em certo sentido, a ideia da existência de uma memória voltada ao coletivo comporta necessariamente uma diversidade de posições, o que corresponde à universidade dos sujeitos. Talvez, fosse melhor dizer que montamos um pequeno mapa de lembranças sobre o hip-hop, um dos muitos possíveis mapas da estruturação da periferia e suas manifestações culturais. Estávamos conscientes sobre esta condição que invadiria a todos os depoimentos, inclusive com recorte e viés que poderiam ser por nós introduzidos, pois, afinal de contas, propúnhamos temas.
            Sabíamos que a fala de cada um trazia a sua percepção individual, e é nesta percepção que entendemos os depoimentos que irão ser publicados.  Para nós, eles são formas de recordação, momentos de um diálogo entre o indivíduo e sua circunstância a lidar com seu passado e, portanto, com seu modo de vida. Apesar deste recorte e talvez em razão dele, todos são uma  contribuição para a montagem da discussão histórica sobre esta periferia.
            Na verdade, estamos diante de uma série de perguntas que poderiam estruturar um longo texto. Uma delas diz respeito a como elementos da cultura negra americana transformaram-se em elementos locais, construídos e explicados pela densidade das relações que se formam particularmente estabelecidas na periferia de Maceió? Claro que estamos também, diante de uma sistemática que é a rede de comunicação. Os jovens de Maceió estavam sendo integrantes e integrados a essa rede que se traduzia em cinema, discos dos começos do peso da tecnotrônica no enlaçamento de relações sociais em nossa capital: o mundo foi ficando cada vez mais aqui.

Música, dança e sociedade

           
O pessoal do Jacintinho
           Isso significa que a penetração da música e da dança negra americana em Maceió é algo que, apesar do largo convívio pelos discos, revistas e filmes,  poderia ser datável naqueles idos da urbanização, incorporando a aproximação midiática. Sempre o que era de fora teve presença aqui dentro. Muitas pessoas pegaram o trem de ferro e vieram a Maceió ver a maravilha do cinema falado, e desde os tempos, por exemplo, de Tom Mix, os meninos brincavam de bandido e mocinho.  Mas os tempos sempre foram diferentes.
            Houve uma época em que Sorokin,  “sociólogo russo branco”, esteve em muita evidência, inclusive por sua discussão sobre a mobilidade social. Ele tem uma tirada interessante, embora não seja capaz de chegar às últimas consequências do que falou, pela insuficiência da base teórica utilizada. É possível discutir que os pobres de um determinado país são bem mais próximos dos pobres de outro  do que são dos ricos do seu. Isso faz sentido, se pensarmos que os pobres sempre estarão em condição de dominados, e os ricos de dominantes.
           
Então, mudando o que deve ser mudado, ou seja, respeitando o contexto, os passos de um segregado de New York não são iguais aos de um segregado no Jacintinho, mas são de pobres pelo perfil que têm dentro da organização política e cultural. Na hora mesma em que, por exemplo, o hip hop foi sendo importado, ele foi se tornando, imediatamente em ripi ropi, como o reggae jamaicano – o que nos chegou já era londrino, via impressoras, selos – não se pode falar que é de fora e nem pode ser repudiado como exótico, invasor de nossa fauna e flora artísticas.  
            Ele não é e nem poderia ser rastafari, o conteúdo religioso estava transformado, não se faria presente na vida alagoana. Ele é o regue-de-nós-mesmos como temos o ripi-ropi-de-nós-mesmos, extensos substantivos a fazerem face a extenso processo de criação e de recriação que permeia o encontro das formas pobres.
            Jamais poderemos dizer que os fatos aconteceram como o Dj Ary narra, mas, com toda certeza podemos afirmar que é desta forma que o Dj constrói a sua fala sobre os acontecidos, representa seu modo de ser, enuncia suas verdades. Isto nos permite djzer que a malha da memória social requer polifonia, muitas vozes, cada uma acentuando modos de ver, de sentir, de expressar diferenciados. Nós estamos diante da forma e modo com que o Dj Ary captou o seu tempo e construiu suas lembranças.
            Os trabalhos de Lewis que passavam pela narrativa intra família, como, por exemplo, filhos de Sanches, são fontes excelentes para a demonstração da pluralidade de olhares e de falas. Com esta afirmativa, nada estamos apoiando quanto ao círculo fechado que ele abre com a ideia da cultura da pobreza – poverty culture. Apenas levantamos o seu nome, para argumentar quanto à riqueza de termos depoimentos, não os somarmos e andarmos pelo eixos que os estruturam. Lewis foi apenas um lembrete de boa técnica de percepção de falas e sujeitos e do que se pode terminar fazendo de mau com tudo isto, quando se acelera conclusões. Ele também saiu de moda e foi parcamente traduzido para o português.
            O que desejamos, no fundo, é um diálogo com a circunstância do ripi-ropi-de-nós-mesmos, perguntar a ela, esperando que ela fale de si pela pluralidade de vozes que a representam, sabendo que ela está, de forma particular, em toda fala que se pode ter sobre ela,  vinda ou não, direta ou indiretamente dela. Como se nota, estamos em um  tipo de suporte que se aproxima da instigação hermenêutica.
            Sem dúvida ela é instigante, mas insuficiente e temos de avançar para a organização que temos, dando como razão suficiente, algo que é trivial: existe um ripi-ropi-de-nós-mesmos, por termos uma organização de nós mesmos e daí podermos ver que, com consciência ou sem consciência claramente posta, uma juventude foi em busca de sua liberdade e marcou lugares privados e públicos e foi tecnotronicamente à rua, para usarmos a bela expressão criada e argumentada por Darcy Ribeiro.

Um universo político

Ari Oliveira apresentando o DJ Alexandre Araújo
            É quando podemos encontrar o ripi-ropi-de-nós-mesmos sendo, claramente, também, um elemento do universo político, do jogo do poder, fundado nele e em suas relações. O ripi-ropi emerge no que hoje é chamado de periferia e  a expressa de uma determinada forma; emerge e situa-se em nós mesmos, nesta Alagoas concreta que tem o fantasmagórico urbano da Maceió inusitada em que vivemos. Ele não precisa declarar-se político; simplesmente é.
            Por outro lado, estamos diante da distinção que sempre mencionamos entre uma Alagoas-de-dentro e uma Alagoas-de-fora e é necessário reconhecer que o  ripi-ropi-de-nós-mesmos está nas Alagoas-de-dentro, no profundo de nossa condição histórica. Ele surge incorporando o de fora e o alinhando ao de dentro, parecendo-nos demonstrar que a pobreza tem o poder de incorporar o de fora pelo expressivo que se torna em seu cotidiano. Jamais poderíamos afirmar que o ripi-ropi-de-nós-mesmos nasceria e se manteria nos altos setores de capital; ele surgiu periférico e se mantém como uma das formas de expressar a condição de ser e estar periférico tenha quantos fracionamentos suporte.
            É, sobretudo importante, verificar como o movimento vai ganhando espaço público e como as manifestações vão ganhando público, o modo como vai sendo construída a presença do que estava em gueto, inclusive,  na ampliação  de espaço  utilizando emissoras de rádio. A periferia passa a existir como categoria em praça pública, dando, inclusive, espetáculo para os que passavam em zonas centrais e estratégicas de Maceió: a frente do Cinema São Luiz e a Praça dos Martírios.          
Não era um qualquer que estava ali, e a imensa maioria deveria ser constituída de pessoas de baixa renda vindas das áreas pobres.  Havia o que afirmar perante a cidade e a música, a dança, as artes traziam um corpus político onde a condição negra aparecia. Necessariamente, o negro surgia, pois ele é a base da baixa renda e a transformação do que era de fora em Alagoas-de-dentro foi buscar, em larga escala, justamente, o que era negro, o que estava nas Alagoas profundas e se fez dela.
            Um outro ponto que deveríamos levar em consideração ao pensarmos nas origens,  é que o movimento começa a acontecer ao mesmo tempo em que Maceió se desprovincializa, mudando hábitos, costumes. A partir dos anos sessenta, Maceió vai entrando em atualização, mudando seus hábitos, especialmente quando se dá a transformação da paisagem em mercadoria mantida e vivida pelas Alagoas-de-fora, na medida direta em que se inventa a orla, cognome do exótico.
            Paulatinamente, Maceió vai se vestindo do novo; circulam os jornais alternativos, aparece o rock, peca-se mais perto de casa; os primeiros motéis eram longe, batia-se no Catolé, e cresce a Maceió de fora, aprontam-se os hotéis. Boites aparecem.
            É esta mudança que viabiliza em boa parte, o início da profissionalização do DJ, da figura pública que ele encarna, que passa a vender sua força de trabalho hábil para manter as danceterias e, ao mesmo tempo, comprometem-se diretamente com a existência de um movimento que, do ponto de vista de uma visão do urbano (orla) apontava para uma modernização no lazer. Eles eram tão modernos quanto, por exemplo, a Midô. E, desta forma, se o ripi-ropi-de-nós-mesmos não poderia estar significando a modernização, no mínimo, ele estava em seu quadro.
            Parece-nos que o momento é rico, denso, como presença de inúmeros fatores, desde uma modernização pensada para fora pelo capital à afirmação, para dentro, de uma juventude que buscava forma de sair da mesmice.  Afirmava-se uma juventude periférica dentro de um contexto de modernização para fora e ela encontraria seu espaço público, delineando uma exemplar força política, em um contexto a que muitos chamariam de alienação, mas, categoricamente,  o encontro de brecha social de expressão que foi conquistada e densamente vivida. Uma dobra aparecia na mesmice com que se pensava branca, a cultura alagoana.
            Na certa expressavam dados da tensão vivida entre uma elite e setores dominados. Possivelmente, a melhor maneira de ver o ripi-ropi-de-nós-mesmos é buscar a natureza desta tensão e como uma parcela de juventude atropelada por uma organização excludente, buscou a afirmação de seu lugar e não teve medo de estar e fazer-se pública, gerando, até mesmo, sinais de identificação.
          
  É quando dançar vai além da arte, sendo uma expressão política. Ao mesmo tempo em que o jovem se identificava em grupo quando dançava, constituíasse em elemento estranho ao local e terminava dando um espetáculo que a moralidade vigente consideraria demonizante. Seria de esperar que toda a ordem de preconceito se voltasse contra essa juventude, especialmente, quando a cor estava em jogo, com a censura continuando a querer o pobre contido dentro do círculo de pobreza que para ele havia sido criado.  
            É quando nos vem à mente, o grande achado que foi uma expressão criada por Poliakov: a diabológica. A diabológica demoniza, transforma em mal tudo que é fora do universo que a cria, mantém e dá-lhe sentido cotidiano. A juventude vencia a diabológica por dizer, inclusive, que o público era dela, uma forma de desinventar o gueto. Foi,  sem dúvida, um belo momento de afirmação.
            Apesar de não ter o viés político como bandeira alçada, não deixa de nos  chamar a atenção, o modo como consegue estar e viver o movimento ainda dentro de um sistema ditatorial, que não deve ter encontrado neles um elemento de caracterização de esquerda, mas sem dúvida, a mera busca de expressão livre já ocasionava um rompimento com o ditatorial.
            Não há uma militância política organizada contra o sistema,  estruturada enquanto contestação, mas era algo diferente, pois, no fundo a sua grande importância consistiu no fato de que uma parcela da juventude periférica encontrou-se, soube que existia e resolveu demonstrar-se, quem sabe, uma das gêneses da atual juventude negra que permanece livre em suas manifestações, como está nas músicas do Boka, do Invasor e de tantos outros..
            Deve ser visto com muito cuidado,  a ligação do início desse movimento e a tomada de consciência de que se definiria uma movimentação em busca de demarcar a periferia. Neste sentido a música e a dança que se produzia falavam de uma geração que se assumia pobre e demonstravas-se pobre, bem como diferente. Muito possivelmente, está, aí, a demonstração de que existia uma geração vinda do processo de urbanização dos anos 60 e que era uma geração a entender-se periférica, mesmo que não existisse clareza nesta visão. Ainda não era o tempo dela acontecer. Embora, fosse estatisticamente insignificante frente ao total da população pobre, ela trazia a consciência do diferente e rompia com a pedagogia da opressão que lhes ensinava o caminho da submissão ao sistema. A Praça e a Rua são nossas, era o que afirmavam, dentre tanta coisa, as danças.
            É ainda de pensar que ela trazia o germe da consciência negra,  quando afirmava o hip hop, e a black music. Havia uma determinação de fatores negro, sendo interessante perguntar, porque fora buscar os veículos tão longe? Teria sido pelo prestígio das formas estabelecidas em sistemas econômicos avançados? Seria a impossibilidade de recuperar e introduzir essa negritude nas folganças tradicionais que sempre tiveram lugar na periferia? Debater essa questão é importante pelo valor heurístico. O fato é que se poderia acusar de alienação cultural, mas sem fundamento, pois, era o exercício possível de uma juventude buscando uma afirmação pública de independência. Daí as roupas, o comportamento, as regras de relacionamento interno, o modo de se demonstrar para o seu local e para a sua cidade.
            Este processo continua, mas encontrando fórmulas e formas diferentes, como não poderia deixar de ser, inclusive pelo modo como vai se transformando em algo complexo, as relações culturais que vivem na periferia; são muitos os grupos artísticos que se estruturam de forma diferente. A periferia é fortemente lastreada em continuidade de folguedos, dos quais pouco se chega no passado, como a quadrilha, o coco, o bumba meu boi. Rara a zona periférica de Maceió que não conte com uma dessas manifestações, das quais a quadrilha foi a que recebeu a maior espetacularização, reformatação coreográfica e investimento.
            O prestígio do ripe-rope continua, mas a forma de sua organização não passou pela sofisticação que as outras sofrerame, não foi submetida ao adestramento do Estado  que domesticou o boi – expressão que tomamos de empréstimo –, patrocinou o coco, concursou as quadrilhas.  O importante é que tudo nos leva para a dinâmica da periferia, para lugares que a moralidade burguesa, ao invés de olhar para o seu umbigo, aponta como o local da marginalidade criminosa.
            A grande entrada de evangélicos no hip hop, sem dúvida foi a grande mudança que ocorreu em seu universo, aquilo que era contestador por excelência para adquirir “legalidade” poderá tornar-se em um espaço conservador. Isto é algo que aconteceu com muito das situações contestatória em Alagoas. É o que aconteceu com o espiritismo e com o próprio protestantismo que ingressaram como contestadores ao modo católico e terminaram por assumir modos conservadores.

Terminando a conversa

                Não é possível pensar em conclusões em um texto como este. Apenas visitamos o assunto e assentamos algumas inquietações;  existem pistas em nosso texto que nos encaminham bem mais para a periferia do que, propriamente, para o ripi-ropi-de-nós-mesmos. Ele é apenas mais um dos detalhes desta periferia, que merece ser estudada e, sobretudo, respeitada.