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sábado, 17 de setembro de 2016

AS DROGAS SOB PERSPECTIVAS INSTITUCIONAIS

droga sociedade estado


Dois dedos de prosa

Mais uma Roda de Conversa acontece e desta feita teve a Professora Karla Padilha como Coordenadora. Coloca em destaque a problemática da droga perante o poder.  Ao ver de Campus, estamos diante de uma problemática que ocorre e se desenvolve no contexto das relações que se montam  numa sociedade excludente, numa política violenta e numa economia que favorece ao empobrecimento. Fora disto, e portanto descontextualizando, tudo se perde no vácuo promovido pela ausência da questão do poder.

Campus sente-se honrado por publicar parte das reflexões que foram produzidas e  agradece à Karla Padilha, Alexandra Beurlen, Cléssio Moura de Souza, Ryldson Martins, estudiosos da questão e atuantes profissionais em suas respectivas áreas.
Agradecemos a Eduardo Bastos

Outros números decorrerão destas atividades em torno do projeto de um livro.

Vamos ler

Um abraço

Sávio

AS DROGAS SOB PERSPECTIVAS INSTITUCIONAIS  - diferentes visões de um mesmo problema

Karla Padilha
Doutoranda em Direito e Promotora Pública da Capital


Dentro da ideia de se estudar e debater uma questão que se apresenta como alarmante em território alagoano, inicia-se uma série de RODAS DE CONVERSAS,  a fim de melhor aprofundar o tema e investigar diversas perspectivas que possam apontar para saídas e caminhos possíveis para enfrentamento do problema.

A primeira delas teve como facilitadora ALEXANDRA BEURLEN, Promotora de Justiça Titular da Promotoria da Infância e da Juventude da Capital, atualmente com atuação nas investigações sociais de atos infracionais praticados por adolescentes em conflito com a lei. Além de membro do Ministério Público, Alexandra é mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e possui livro publicado sobre o direito à alimentação adequada, tendo se mostrado extremamente sensível às causas que traduzem a defesa dos direitos fundamentais da pessoa humana.


Sua atual experiência profissional faz de Alexandra uma profunda conhecedora dos efeitos deletérios que o acesso à droga traz para a geração de crianças e adolescentes em nosso Estado, o que a tem feito ajuizar inúmeras ações civis púbicas visando garantir o que o Estatuto da Criança e do Adolescente preconiza, no que diz respeito a um tratamento preferencial da pessoa em formação, sobretudo quando se encontra em situação de vulnerabilidade social e econômica.

Sob esse viés, o assunto foi debatido também por outros juristas, a partir das lentes e das vivências profissionais de cada participante, fazendo brotar uma discussão rica em argumentos, ideias e proposições. Alexandra Beurlen optou por tratar da relação do tráfico de drogas com a prática de atos infracionais. Invocou também a questão de se perscrutar o porquê das classes sociais mais elevadas não levarem seus conflitos para o poder público. Ressaltou o ideário do ECA fundado na intervenção mínima do Estado. Na prática, reconhece que a intervenção do Estado dá-se nas classes sociais menos favorecidas.

Do universo de adolescentes conduzidos pela força policial a sua presença pode observar que cada um, não raro, traz consigo histórico de dramas familiares, que passam pelo abandono, prisão, morte e outras problemáticas comuns nas classes mais pobres. Entretanto, destaca que tais dramas não constituem fator determinante para justificar a opção pela droga, já que são conjugados com outras concausas individuais, como a personalidade de cada um, conforme estudos psicossociais sobre o assunto.

Chama a atenção para um discurso que reflete uma visão socialista e que estaria sendo inadequadamente apropriado, em que o Estado aparece como opressor e o criminoso, como oprimido. Muitas vezes, segundo Alexandra, o adolescente não se consegue perceber como protagonista da própria história. Outro aspecto para o qual chama a atenção é o de que o adolescente infrator, em regra, está fora da escola havendo, assim, uma relação importante entre ato infracional e evasão escolar. Outro traço marcante que carregam os adolescentes em conflito com a lei é pertencer a famílias monoparentais ou matriarcais.

Ressente-se Alexandra de uma intervenção precoce na criança que posteriormente passa a cometer atos ilícitos. Reconhece as deficiências das unidades de internamento e a sua atual incapacidade para recuperar os que lá estão. Nas intervenções que se seguiram, o Defensor Público RYLDSON MARTINS destacou o perigo da discricionariedade feita pela polícia e que pode vir a interferir na opinio delicti do Ministério Público, no que se refere à separação entre quem é usuário e quem é traficante. 

Alexandra refutou, alegando que, para ela, tal prévia seleção não exerce qualquer influência, já que avalia cada caso de acordo com a narrativa detalhada contida no flagrante. Ryldson aponta para uma tendência de que os membros das classes altas sejam identificados como usuários e os mais pobres, como traficantes. Também chama a atenção para a necessidade de que se estude o que de fato leva os adolescentes a praticarem atos infracionais. Registra ainda Ryldson que a droga seria uma espécie de “pivô” de muitos outros delitos. Além do tráfico, destaca os crimes contra a patrimônio e contra a vida.

Aponta para o uso de creches e escolas em tempo integral como uma alternativa preventiva para o problema. Micheline Tenório, Promotora da Saúde, também participou do evento, destacando os efeitos deletérios que a droga produz, inclusive nos filhos de mulheres que fazem uso frequente de substâncias entorpecentes: muitas vezes, tais crianças sofrem de crises de abstinência, em face do vício de suas mães.

Cléssio Souza, doutorando na Alemanha e que se dedica ao tema, destaca a importância de que seja dado um recorte no tema, optando por uma visão macro ou micro de abordagem, enfatizando que o acadêmico não possui o dever de oferecer soluções prontas para quaisquer problemas, havendo, sim, que selecionar uma forma de enfrentar o objeto de estudo, sabendo-se que uma visão micro parece chegar mais perto da ideia de exaurimento e categorização do que se aborda. Já o professor Sávio Almeida entende ser difícil consertar problemas que vêm de uma sociedade extremamente injusta. Como visto, o debate foi rico, multifacetado. E que os leitores possam colher da escrita de cada autor novas luzes para abordagem de tema tão polêmico e instigante.   

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