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sexta-feira, 25 de julho de 2014

Esta matéria foi publicada no tablóide Contexto do jornal Tribuna Independente, Maceió, na edição de  6  de Novembro de 2011

Um pequeno bilhete sobre o quebra de 1912














Durante o mês de novembro, Contexto procurará abordar questões relativas ao mundo afrobrasileiro. Hoje, traz material produzido por um Mestre em Sociologia, retirado de sua dissertação, e que fala sobre o Quebra de 1912, acontecimento fundamental para a história cultural e política do negro alagoano cujo tratamento, como já discutimos, merece extremo cuidado para não reduzir a história negra aos momentos da história branca, devendo ser levado em conta, também,  que a fonte para os episódios do Quebra propriamente dito é única e oposicionista: Jornal de Alagoas.

Luiz Savio de Almeida


 

Momentos pessoais quanto ao Quebra


O trato do Quebra introduziu a figura mítica e mística da Tia Marcelina, deixando-a como emblema das perseguições sofridas pelos cultos em Alagoas. De fato, Tia Marcelina é “recuperada”  na década de 60 do século passado, em processo de afirmação dos cultos em parceria com setores intelectuais da classe média, carreado pela Federação dos Cultos Afro-Brasileiros de Alagoas e que gerou o I Semana dos Culto Afro-Brasileiros, realizada no Teatro Deodoro, contando na coordenação com babalorixás como Luiz Marinho (falecido, Nagô), Celestino (falecido, Ijexá), Joca (falecido, trabalhava pelas canhotas, Quimbanda) e o Coronel Belarmino (falecido, filho de santo), Edinho (falecido, Nagô). Com  eles  tomei muito xequeté nas saídas de Yaô.

Tenho a grande honra de ter sido, junto com o Bráulio Leite Júnior, membro do grupo que fez a Semana, o anti-quebra no Teatro Deodoro, com os zingomes batendo sem parar desde as seis da tarde e com os terreiros da capital e do interior, assumindo o palco da casa que era da cultura da elite de Alagoas.  Nunca vi tanta gente no Teatro Deodoro e aqui e ali o santo irradiava: dá para se imaginar o quase surreal das cenas. Eu acredito que umas 20 mil pessoas andaram pelo Teatro, que estava encantado pela maestria criativa de Bráulio Leite Júnior ao transformá-lo em um imenso terreiro, com sua entrada sendo peji e congá, com a Umbanda, o traçado e o Nagô dominando o cenário por ele belissimamente montado.

Dentro da macumba, havia partidarização. Os não convidados (havia disputa pelo comando da Federação) metiam o pau, dizendo que nunca viram orixá artista para descer o santo em Teatro e que nenhum era cantor de rádio para estar com microfone. Sei apenas que o universo dos terreiros foi mobilizado. Tudo derivou de uma conversa comigo: éramos Marinho, Celestino e mais outro que não lembro.

Diziam que os terreiros estavam sendo perseguidos pela polícia e até falavam em cobrança de um dinheirinho.   Precisávamos de um grande evento, capaz de escancarar os terreiros. A festa de Iemanjá não bastava. Seria certo, errado? O fato é que dei a idéia da Semana e toparam na hora. Saí e fui direto falar com o Bráulio –  amizade íntima  e de imenso carinho – e ainda hoje é um cara destemido. Na hora! Seu talento deu vida à macumba no Teatro. E viva o Bráulio Leite Júnior! Nossa, houve pressão! O que era aquela doidice no Teatro? Recebi recados. Mas tudo entrava por um orixá e saía pelo outro. Bráulio foi um companheiro brilhante; eu sabia que jamais ficaria sozinho. Quem morreu de trabalhar foi o Marcelo Texeira, pessoa fundamental nisto tudo, segurando a logística do que era um empreendimento gigantesco para a época.

 Essa nossa história eu vou procurar no meu diário e publicar.

 Disse-me o Klébio que o povo ainda fala disso nos terreiros de hoje em dia e Dona Maria do Acais  que baixa  no terreiro do Manoel do  Xoroqué   que é babalorixá no Ilê Axé Legioneré do Xoroqué mandou recado “pro véio Sávio”  sobre o assunto, em nome do “povo da macumba”.  Saravá,  que eu vou de banda!  .

Um dia, o Joca me disse que o Zumba havia encontrado uma fotografia da Tia Marcelina. Fui até à  casa do Zumba conversar com ele. Estava criada a imagem de uma Tia Marcelina. Nem discuti; se eles desejavam a Tia Marcelina daquela forma, daquela forma ela seria. As verdades também são criadas por atos de fé. E entronizei a Tia Marcelina numa parede, certo de que ela havia renascido pela inteligência e pelo pincel do Zumba, gente fina, que na época morava lá pelos lados do antigo Bar das Ostras. A Tia Marcelina estava na parede em minha casa, a janela entreaberta. Passa um cara e me pergunta: “Era essa a mulher que parava o trem com a mão?” Fiquei maravilhado, espantado e o que eu poderia responder?  “É ela mesmo: a Tia Marcelina!”

Vamos ao Quebra.

Luiz Sávio de Almeida

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